Rosiene Cardozo
A morte é uma das únicas certezas que o ser humano tem. Em fração de segundo o coração pode para de pulsar, e a história chegar ao fim. Mas é possível, mesmo depois de morto, contribuir para o avanço da ciência e colaborar com as pesquisas dos professores e acadêmicos da área de saúde da UFT doando corpos para o projeto “Doar é um ato de ressignificar a vida”.
A forma mais comum de obtenção de corpos pelas universidades, tanto públicas quanto privadas, é via Instituto de Medicina Legal (IML). Assim, seguindo a lei 8.501/92, que em seu art.2º, diz: “o cadáver não reclamado junto às autoridades públicas, no prazo de trinta dias, poderá ser destinado às escolas de medicina, para fins de ensino e de pesquisa de caráter científico”, espera-se todos os prazos e só após isso o corpo poderá ser doado. Muitos corpos já chegam em estado de decomposição, devido ao tempo de espera, visto que, o cadáver deve ser formolizado em até 72 horas. Ainda há um sistema de rodizio entre as universidades que receberão os corpos e isso gera um grande espaço de tempo.
Na Universidade Federal do Tocantins (UFT), a quantidade de corpos que chegam via IML é muito inferior em relação as reais necessidades e a maioria dos cadáveres que estão sendo estudados são oriundos do IML na forma de não reclamados (sem documentação, endereço, informações ou responsáveis legais), ou seja, a doação voluntária de corpos ainda é um tabu para a sociedade. De acordo com uma das elaboradoras do projeto e também professora de anatomia, Tainá de Abreu, a UFT possui apenas 14 cadáveres, sendo que 13 deles foram doados entre os anos de 2007 e 2013. “Esse grande intervalo sem a chegada de novos cadáveres tem dificultado e impossibilitado muitas das atividades de ensino e extensão” afirma.
Ainda segundo Tainá, somente no ano de 2018 o Laboratório de anatomia recebeu 1.391 alunos para aulas de graduação e monitoria e 704 visitantes dos projetos de extensão. “Correlacionado o tempo de uso com a grande quantidade de alunos que estudam os corpos é notável que a maioria dos cadáveres atualmente não estejam com qualidade e boas condições para o ensino. Além disso as práticas de dissecação que são imprescindíveis para uma formação médica mais íntegra estão cada vez mais ameaçadas devido as condições dos cadáveres” declara.

Devido a estas condições, a UFT aprovou esse ano um projeto cujo slogan é “Doar é um ato de ressignificar a vida”, para solucionar essas questões, com intuito de sensibilizar a sociedade em relação a doação voluntária de corpos e/ou órgãos para o ensino, pesquisa e extensão. Uma vez que, o cadáver é a principal ferramenta de aprendizado cientifico e treinamento para os futuros profissionais da saúde, pois é dele que os estudantes colhem os primeiros ensinamentos que os farão compreender a proporção das particularidades do corpo humano. Além de ter que aprender a controlar suas emoções ao deparar com um corpo e reconhecer a fragilidade da vida, já que será seu “primeiro” paciente.

“O projeto é muito importante para o nosso aprendizado, por que nós temos diferenças anatômicas, o meu corpo é diferente do seu, em relação ao tamanho, posição dos órgãos, então o contato com o corpo real facilita, e sairemos da faculdade sabendo como é realmente o corpo humano, como eu devo agir, e onde está cada órgão, cada detalhe, que é o mais importante. Então o projeto tem uma relação muito grande com a comunidade em relação à comunidade e ao ensino, cria uma relação muito produtiva” ressalta Walesca Rodrigues estudante de Nutrição e integrante do programa.
Juliana Gonçalves, estudante também de nutrição e que faz parte do projeto, afirma a importância do uso dos corpos reais (corpo humano) na formação dos futuros profissionais. “Nas peças sintéticas nós não” conseguimos ter noção de realmente como é a textura, cor, aparência, variações anatômicas, detalhes que conseguimos ver apenas nas peças reais, e isso é muito importante para nós estudantes, por que vamos lidar com isso, o real, então o mais próximo que a faculdade estiver do mercado de trabalho e da realidade que a gente vai enfrentar quando sair daqui, melhor!” conclui.
O programa oferece um outro caminho para os corpos, uma vez que, os preceitos convencionais são o sepultamento em jazigos e a cremação. O projeto já é adotado por vários países e algumas universidades brasileiras. Embora as implementações desses programas sejam tão recentes, algumas universidades já conseguem suprir suas necessidades exclusivamente das doações voluntárias, como por exemplo, a Universidade Federal de Minas Gerais, a Universidade do estado de São Paulo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a Faculdade de Medicina do Rio Grande do Sul.
A UFT disponibiliza no site os documentos para ser preenchidos aos interessados em fazer a doação voluntária, tanto de familiares como o seu próprio corpo, e também para os interessados em doar órgãos.






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