Brasil é o segundo lugar do mundo que mais mata ambientalista

Promotor de Justiça do Tocantins alerta para riscos e revela ausência de políticas estaduais

Por Loara Tomaz

Acompanhe a entrevista com o Promotor Jorge Maria Neto para o CalangoPress

O Tocantins é um dos estados da Amazônia Legal que não contam com qualquer programa de proteção a defensores ambientais, segundo o novo Índice de Democracia Ambiental, divulgado pela Transparência Internacional – Brasil e pelo Instituto Centro de Vida (ICV). O levantamento avaliou o desempenho dos nove estados da região em critérios como acesso à informação, participação social e proteção a defensores e defensoras do meio ambiente.

De acordo com o estudo, apenas Pará, Maranhão e Mato Grosso possuem iniciativas estaduais voltadas para a proteção de pessoas ameaçadas por uma atuação ambiental. Nos demais estados – incluindo o Tocantins – predomina o que os pesquisadores classificam como “quase completa ausência de canais de denúncia, protocolos policiais especializados e capacitação de agentes públicos para lidar com esse tipo de caso”.

O promotor de Justiça Jorge José Maria Neto, responsável pela Promotoria Regional do Alto e Médio Araguaia, especializada em meio ambiente, confirma o diagnóstico.

Promotor Jorge José Maria Neto, destacou a importância do processo de mediação e do diálogo entre as partes [Foto: Foto: Rondinelli Ribeiro – Ascom TJTO]

O promotor aponta que a ausência de políticas públicas específicas cria um ambiente de risco constante para ambientalistas, pesquisadores, lideranças de povos indígenas, comunidades tradicionais e demais atores sociais envolvidos na defesa ambiental.

“No Tocantins, não há protocolos de investigação para casos de ameaças, nem linhas diretas de denúncia, nem equipes especializadas para atender essas pessoas. Quem atua na defesa do meio ambiente está, na prática, também atuando na defesa dos direitos humanos”, afirma.

Segundo Jorge Neto, a falta de estrutura tem consequências diretas sobre a segurança de quem está na linha de frente. “O Brasil é o segundo país do mundo que mais mata ambientalistas. Muitas dessas mortes são precedidas por ameaças que sequer foram apuradas de forma adequada”, alerta.

Tocantins está entre os estados avaliados como “pessimos” em medidas de proteção ambiental na Amazônia/Imagem: Freepik

Impunidade e invisibilidade institucional

Além da vulnerabilidade individual de cada defensor ambiental, o promotor destaca um problema estrutural: a falta de integração entre os órgãos públicos.

Estados que possuem programas de proteção conseguem articular Ministério Público, Polícia Ambiental, órgãos de controle fundiário e outras instituições numa rede de resposta rápida. No Tocantins, essa articulação ainda é limitada

Ele defende que o protocolo de investigação para crimes ou ameaças contra ambientalistas seja diferenciado, levando em conta a motivação e o contexto de risco. “A investigação de um assassinato ou ameaça a um defensor ambiental não pode seguir os mesmos procedimentos de um crime comum. Essas pessoas são ameaçadas por causa de sua função social”, ressalta.

O promotor também chama atenção para a invisibilidade institucional enfrentada por esses profissionais. “Muitas vezes, as ameaças não são tratadas com a devida gravidade. Isso cria um ambiente de impunidade que desestimula novas lideranças a ingressarem na luta ambiental”, diz.

Propostas de solução

Entre as medidas consideradas urgentes para o Tocantins, o promotor Jorge Neto lista:

  • Criação de um canal exclusivo de denúncias, com funcionamento 24 horas, possivelmente vinculado à Polícia Ambiental;
  • Capacitação das forças de segurança, com formação específica para lidar com crimes e ameaças contra defensores de direitos humanos e ambientais;
  • Integração institucional, com articulação entre Polícia Civil, Polícia Militar Ambiental, Ministério Público e órgãos de fiscalização ambiental;
  • Criação de um cadastro estadual de defensores ambientais em situação de risco, com proteção de sigilo e medidas de segurança para os cadastrados;
  • Maior participação social, garantindo a presença de defensores ambientais em audiências públicas e processos de formulação de políticas ambientais.
  • Diálogo com  programas federais já existentes, buscando a criação de um programa estadual específico para o Tocantins.

Contexto nacional e internacional

O relatório da Transparência Internacional reforça a importância de medidas estruturantes e aponta como uma prioridade nacional a ratificação do Acordo de Escazú pelo Congresso Nacional.

O tratado regional, em vigor desde 2021, estabelece diretrizes para garantir o acesso à informação, a participação pública e a justiça em temas ambientais, além de prever mecanismos específicos de proteção aos defensores do meio ambiente. O estudo destaca que o acordo pode ser um marco importante para que estados como o Tocantins avancem nessa agenda”.

O problema da violência contra defensores ambientais no Brasil é histórico. Relatórios internacionais apontam o país como um dos mais perigosos do mundo para quem atua na proteção de recursos naturais e de comunidades tradicionais. Em muitos casos, as vítimas já haviam denunciado ameaças, sem que houvesse providências eficazes.

Exemplos recentes, como os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, no Vale do Javari, reforçam a urgência de medidas de proteção, inclusive nos estados com menor histórico de conflitos, como o Tocantins.

“Enquanto não houver um reconhecimento institucional da importância desses profissionais, e uma rede de proteção eficaz, vamos continuar expostos a tragédias anunciadas”, conclui o promotor

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Um Projeto de Pesquisa e Extensão idealizado para as atIvidades práticas de reportagem, produzido com a participação dos acadêmicos do curso de jornalismo da UFT.

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