20ª Semana da Diversidade  LGBTQIAPN+  continua até domingo

Com o tema “As Precursorxs do Tocantins”, a programação tem o ponto alto com a Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ que sairá do Espaço Cultural


Acompanhe a entrevista completa com o poeta Fúcsia, autor de Cuecas Freadas

Por Itiane Ferreira

A semana começou colorida, desde quarta-feira (11)  na capital do Tocantins com a 20ª Semana da Diversidade e Inclusão Social de Palmas. Com o tema “As Precursorxs do Tocantins”, a programação segue até o próximo domingo (15), finalizando com a 20ª Parada do Orgulho LGBTQIAPN+, que terá concentração no Espaço Cultural José Gomes Sobrinho e encerramento na Feira do Bosque.

Organizada pelo Coletivo da Diversidade Tocantinense em parceria com a Prefeitura de Palmas, a Semana propõe homenagear pessoas que abriram caminhos na luta por direitos e dignidade LGBTQIAPN+ no estado. A programação inclui debates, rodas de conversa, ações de saúde, oficinas e manifestações culturais voltadas à afirmação da diversidade e à construção de políticas inclusivas.

Programação completa:

  •  11 de junho (quarta-feira) – Audiência Pública Participativa: Empregabilidade para a População Trans, às 14h, na Câmara Municipal de Palmas .
  • 12 de junho (quinta-feira) – Audiência Pública: Mães da Resistência, às 14h, na Câmara Municipal de Palmas.
  • 13 de junho (sexta-feira) – Encontro Estadual LGBT do Partido dos Trabalhadores, das 9h às 12h e 14h às 17h na Câmara Municipal de Palmas.
  • 14 de junho (sábado) – Atividades Esportivas LGBTQIA+ na Praia da Graciosa, às 16h; Festa Pré-Parada no Lanterna Lounge Bar, às 22h30.
  • 15 de junho (domingo) – Parada LGBTQIA+: concentração a partir das 14h no Espaço Cultural José Gomes Sobrinho, a largada da parada, às 18h, e o encerramento festivo na Feira do Bosque, às 23h.

Cultura e resistência: a força da comunidade LGBTQIAPN+ na capital tocantinens

No Tocantins, movimentos culturais protagonizados por pessoas LGBTQIAPN+ vem se consolidando como espaços de expressão e resistência, unindo a arte,  a militância e a ocupação de espaços públicos. Um exemplo que trazemos é o poeta Queer Fúcsia, autor do livro *Cuecas Freadas*.

Uma iniciativa que revela como arte, corpo e identidade se entrelaçam para ocupar espaços e criar novas formas de narrar vivências LGBTQIAPN+ no estado.

Publicado em 2023 pela editora Pedregulho, Cuecas Freadas não é apenas um livro de poesias  é um manifesto visceral. O autor,Lennon Costa conhecido como  Fúcsia, constrói uma poética que mistura homoerotismo, iconoclastia, escatologia e surrealismo, desafiando tabus e padrões normativos, especialmente aqueles impostos pela religião e pelo moralismo.

O autor comenta que enviou o material através de uma chamada aberta pela editora: “É uma editora LGBT, feita por LGBTs… ela recebeu o material, acreditou, viu a potência dele e a gente conseguiu essa publicação. E como poeta queer, tocantinense, eu me sinto muito feliz de ter publicado esse livro. Eu acredito que essa poesia homoerótica, escatológica, iconoclasta, surrealista, essa poesia encardida, essa poética do encardido, ela tem lugar também na produção tocantinense” 

“A poesia não tem utilidade, não serve ao capitalismo. Ela é um bem em si mesma”, provoca o autor, ao explicar o propósito da obra. Para ele, escrever poesia é um ato de criação por excelência, um gesto tão radical quanto o gesto de existir como um corpo dissidente no mundo.

Uma poesia fragmentária, visceral e imagética

O processo de escrita do livro durou seis anos e começou em Porto Nacional, Tocantins, quando o autor assumiu o concurso na UFT (Universidade Federal do Tocantins), atualmente ele é secretário do curso de Jornalismo. “Minha poesia é feita a conta-gotas. Vou anotando no celular, na agenda. As metáforas vêm prontas, aos pedaços, e depois eu junto tudo”, conta.

Essa forma de criação fragmentária faz com que os poemas sejam densos em imagens e metáforas. Para Fúcsia, cada metáfora carrega uma visão inédita de mundo. E essa visão é marcada pelo desejo, pelo corpo e também pelo trauma.

“Minha poesia é uma poesia do cu. É uma poesia dos orifícios, da carne, do corpo”, define. Não à toa, o título Cuecas Freadas provoca justamente essa ideia de sujeira, transgressão e deboche:

as características principais da minha poesia, é uma poesia homoerótica, uma poesia escatológica, uma poesia iconoclasta e uma poesia surrealista. E por isso que o título veio, esse título polêmico, esse título cuecas freadas… Por que não escrever uma poesia do cu? Por que não escrever? Por que me limitar ao bom gosto? Por que me limitar a uma estética asséptica, a uma estética não me toque? Não existe isso, a gente está na pós-modernidade. Então, se eu não puder fazer uma poesia do cu e para o cu, eu não posso nada mais.” afirma.


Parte da poética de Cuecas Freadas é o enfrentamento à repressão religiosa que o autor viveu na infância e adolescência. Criado em ambiente batista, ele relata episódios marcantes, como quando foi levado à Igreja Universal por familiares para “expulsar a pomba gira” que estaria nele. “A pomba gira estava mesmo…E o que era a pomba gira que ele falava? Minha feminilidade, minha expressão, que não segue o padrão da masculinidade careta, quadrada, bruta, troglodita, né?… é a delícia de ser quem eu sou”, afirma.

Esse passado de violência simbólica e espiritual foi transformado em poesia. “Minha poesia é iconoclasta porque destrói o ícone, destrói o Deus que me excluiu. Eu retorno o valor ao corpo, aquilo que a educação religiosa me tirou.”

Além disso, a obra traz referências pop, com citações que vão de Nazaré Tedesco a Dollynho, e críticas afiadas a figuras da política religiosa, como no poema “Elogio a Silas Malafeio, e aí o título fala por si só, né? Minha crítica a esses comerciantes da fé. 

“O mundo não é homoafetivo, mas é homopopulado”

A crítica social atravessa toda a obra e a visão do poeta sobre o mundo atual é direta: “O mundo não é homoafetivo, ele é hétero-centrado, normativo, dogmático. Mas é homopopulado. Nós estamos em todos os lugares.”

Cuecas Freadas se coloca, assim, como um contributo não só para a literatura, mas também para a luta LGBTQIAPN+. “Minha poesia é uma poética da abominação no melhor sentido da palavra. Nós somos o hackeamento desse mundo careta. Nós somos uma especialização do universo. Não temos nada de antinatural.”

“eu acho que meu livro é um contributo para a comunidade, é uma contribuição para a comunidade, é uma forma de dizer assim, nós somos, nós somos uma especialização do universo, a gente é um resultado original do universo, da natureza, a gente é um produto original da natureza, nós pessoas LGBTs, nós temos um porquê de estar aqui, nós não temos nada de antinatural, né, a natureza nos fez desse jeito, Deus nos fez, se quiser também falar, pensar em Deus, foi Deus que fez a gente assim e a gente tem que só caminhar para uma direção da afirmatividade, né, nunca mais entrar no armário novamente, eu acho que também a minha poesia me ajuda a não voltar para o armário.

O livro é um convite à leitura, mas também ao enfrentamento. Um poema encardido para um mundo que insiste em se fingir limpo. E finaliza citando  epígrafe de seu livro, uma citação do filósofo romeno Emil Cioran: “Se acreditamos com tanta ingenuidade nas ideias, é porque esquecemos que foram concebidas por mamíferos.” e Continua “Ou seja, a gente preza tanto pela razão, pela racionalidade, né? A gente se coloca como topo da cadeia alimentar, né? Nós consideramos muito fodões, mas no fim nós somos mamíferos, nós não deixamos de ser mamíferos.”
A frase, segundo ele, resume o espírito de sua obra. “As ideias são lindas, mas nós continuamos sendo carne. Minha poesia fala disso  do corpo, da condição humana, da nossa animalidade.”

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Calangopress

Um Projeto de Pesquisa e Extensão idealizado para as atIvidades práticas de reportagem, produzido com a participação dos acadêmicos do curso de jornalismo da UFT.

Vinculado ao Núcleo de Jornalismo (NUJOR), o Calangopress funciona como laboratório para as atividades práticas do estágio, supervisionado pela Prof. Dra. Maria de Fátima de Albuquerque Caracristi.