Mulheres e Povos Tradicionais Transformam Desafios em Desenvolvimento no Tocantins

As mulheres se organizam em associações agroextrativistas e os Krahô Takaywrá investem no sistema de piscicultura com foco na criação de caranha

Por Netally Vitoria

O avanço do agronegócio no Brasil tem gerado impactos significativos para pequenos agricultores e comunidades tradicionais. Nesse cenário, as associações agroextrativistas, especialmente aquelas lideradas por mulheres, têm se consolidado como importantes alicerces para o desenvolvimento local e a resistência diante dos desafios do setor. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), as mulheres rurais são responsáveis por cerca de 45% da produção de alimentos em países em desenvolvimento, incluindo o Brasil.

No Tocantins, essas populações enfrentam dificuldades para garantir a permanência em seus territórios e a sustentabilidade de suas atividades econômicas. As associações agroextrativistas têm contribuído para amenizar problemas como o isolamento econômico, a falta de representação política e o acesso limitado a mercados. Além disso, iniciativas lideradas por mulheres têm fortalecido a autonomia financeira e gerado oportunidades de desenvolvimento em comunidades rurais.

Ana Lúcia Rodrigues, presidente da Associação Antônio Francisco Brasil e integrante da Associação Mulheres Agroextrativistas da APA Cantão, em Caseara, relata como essas organizações têm avançado mesmo em meio às adversidades: “Eu vejo um avanço nas associações. Nosso assentamento, Annalise Barros, e as associações têm ocupado espaços nos conselhos municipais e no poder público. Mas precisamos não só estar lá, precisamos ter voz também. Isso é essencial para avançarmos ainda mais.” afirmou.

Embora o cooperativismo tenha gerado avanços, a comercialização de produtos ainda enfrenta entraves significativos. A venda de alimentos para programas como a merenda escolar, regulamentada pela Lei 11.947/2009, que determina o uso de 30% dos recursos na compra de alimentos da agricultura familiar, ainda esbarra em desafios logísticos e burocráticos, “a maior dificuldade é a burocracia, desde o edital até a divulgação das informações. Além disso, há a questão da logística e da falta de locais adequados de armazenamento nas escolas, o que acaba impactando diretamente as nossas vendas,” explicou Ana Lúcia.

Eu vejo um avanço nas associações. Nosso assentamento, Annalise Barros, e as associações têm ocupado espaços nos conselhos municipais e no poder público. Mas precisamos não só estar lá, precisamos ter voz também. Isso é essencial para avançarmos ainda mais.

Ana Lúcia Rodrigues, presidente da Associação Antônio Francisco Brasil e integrante da Associação Mulheres Agroextrativistas da APA Cantão, em Caseara

Apesar desses obstáculos, algumas associações têm conseguido acessar mercados locais e aproveitar os benefícios da legislação, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que pode ser fortalecido pelo PL 1/2024. O projeto, em tramitação no Senado, propõe garantir que o percentual mínimo de 30% de alimentos comprados para a merenda escolar seja da agricultura familiar, criando oportunidades para pequenos agricultores e comunidades tradicionais. Contudo, a aplicação prática da lei ainda enfrenta barreiras.

A luta pelo território do povo Krahô Takaywrá

Enquanto as associações agrícolas enfrentam desafios relacionados ao mercado, como burocracias e infraestrutura insuficiente, o povo Krahô Takaywrá vive um momento crítico em sua luta pela regularização territorial. No dia 25 de novembro, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) realizará uma audiência que poderá definir o futuro de seu território.

“Estamos otimistas, pois percebemos avanços. Porém, se a União e a FUNAI não entrarem em acordo, o desembargador do TRF determinará um prazo para resolver essa questão do território,” explica Davi Krahô Takaywrá, vice-cacique da aldeia.

Apesar das incertezas, a aldeia tem investido em projetos inovadores para garantir a sustentabilidade. Um exemplo é o sistema de piscicultura, com foco na criação de caranha, uma espécie típica da região, “a gente tem aqui um projeto de criação de peixe, onde estamos criando caranha, o peixe típico da região, para começarmos a vender,” conta Davi.

Além disso, a aldeia planeja implantar uma horta comunitária para reaproveitar a água descartada dos tanques de criação, rica em nutrientes e ideal como adubo. Entretanto, limitações financeiras e a falta de demarcação do território têm dificultado a expansão desses projetos, tudo isso gera gastos. Infelizmente, não temos recursos suficientes, e isso atrasa muito. Nosso meio de vida é criar galinhas, porcos, mas morar em uma área de APP torna muito difícil produzir,” relatou o vice-cacique.

Enquanto aguardam decisões judiciais e maior apoio governamental, comunidades como a aldeia Takaywrá e os pequenos agricultores continuam a dar exemplos de resistência e inovação, transformando desafios em oportunidades.

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Um Projeto de Pesquisa e Extensão idealizado para as atIvidades práticas de reportagem, produzido com a participação dos acadêmicos do curso de jornalismo da UFT.

Vinculado ao Núcleo de Jornalismo (NUJOR), o Calangopress funciona como laboratório para as atividades práticas do estágio, supervisionado pela Prof. Dra. Maria de Fátima de Albuquerque Caracristi.