Por Lys Apolinário

A lei  13.104, de março de 2015, foi implementada durante o governo Dilma como medida para punir mais severamente o feminicídio. No entanto, ainda hoje, parte da população, incluindo o atual presidente da república, sequer entende o que é feminicídio e a importância que essa lei tem para que mulheres parem de morrer simplesmente por serem mulheres.

Segundo Franciana Costa, “O feminicídio, assim como todos os crimes que são perpetrados contra a mulher, serão sensivelmente diminuídos quando entendermos que homens e mulheres são iguais em direitos e que nada torna um melhor que o outro”.
F(Arquivo pessoal)

Em um vídeo publicado em 2017, o atual presidente da república, Jair Bolsonaro, declarou  que feminicídio é “mimimi” e que melhor seria que as mulheres tivessem armas para se defender. Brincou ainda dizendo que, assim, não se teria mais feminicídio e sim homicídio.  O presidente sugere, assim, a desresponsabilização do Estado quanto à defesa das vítimas e combate ao feminicídio.

Segundo dados do Monitor da Violência, divulgados pelo G1, o número de feminicídio no país subiu de 1.047 casos em 2017 para 1.173 casos registrados em 2018. Em 2019, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifestou preocupação quanto ao número de casos de feminicídio, que já passava dos 100 ao final de janeiro. Segundo a CIDH, em 2017 40% dos feminicídios praticados na América Latina ocorreram no Brasil.

Em um país ainda dominado pela violência contra a mulher, é difícil fazer com que as pessoas compreendam os mecanismos de funcionamento do machismo, que envolvem diversos tipos de violência contra a mulher, incluindo o feminicídio.  Dessa forma, assim como Bolsonaro, parte da população ainda não compreende a diferença entre o homicídio de mulheres e o feminicídio.

De acordo com a defensora pública e coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEM), Franciana Costa, “o feminicídio é crime de ódio à mulher, de preconceito, de discriminação em razão do sexo. É um crime praticado contra a mulher em contexto de violência doméstica e familiar ou por menosprezo e discriminação à condição de mulher”.

Um crime deve ser classificado como feminicídio quando uma mulher é assassinada por causa de convenções advindas da cultura machista, como o pensamento de que é inaceitável que uma mulher cometa traição, manifeste opinião contrária a algo, desobedeça o parceiro ou ande na rua com determinadas roupas. A objetificação e desvalorização da vida da mulher também são pensamentos machistas que levam ao feminicídio, como a crença de que a mulher é posse do parceiro e portanto pode ser violentada de todas as formas e não tem o direito de se separar dele.

Franciana Costa explica que o que diferencia o feminicídio de um homicídio comum cuja vítima é uma mulher é a motivação do crime, o que move o agente a praticá-lo. “Quando falamos em feminicídio em contexto de violência doméstica e familiar se percebe de forma clara que ocorre em decorrência do entendimento incutido no homem de que é superior à mulher, de que a mulher é um ser subalterno e que lhe deve obediência. Tem relação direta com o sentimento de posse”, explica a defensora.

Diante de tantas mortes de mulheres motivadas pelo machismo intrincado à cultura brasileira, a lei 13.104/15 surgiu como forma de tentar combater os elevados números de feminicídio no país. A lei classifica o feminicídio como homicídio qualificado e portanto, crime hediondo, sendo assim, há uma punição maior para o feminicídio que para o homicídio comum cuja vítima seja mulher.

No entanto, tanto Franciana Costa quanto Suzana Orsine, delegada titular da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher  (DEAM), acreditam que o Estado deve contribuir não apenas com leis, mas também com a oferta de uma educação feminista, que seja capaz de desconstruir os preceitos machistas intrincados desde cedo nas crianças. “Um combate sério ao feminicídio, passa necessariamente pelo enfrentamento do sistema patriarcal e do machismo”, afirma Franciana Costa.

A delegada Suzana Orsine chama atenção para a dificuldade de se falar sobre violência doméstica nas escolas e implementar uma educação feminista, “a gente esbarra no problema que estamos vivendo no Brasil atualmente, tudo o que você fala na escola é doutrinação”. No entanto, entendendo a importância dessa discussão nas escolas e a despeito de retroações na questão, como o projeto de lei escola sem partido, o Ministério Público do Tocantins implementou em 2018 o projeto Anjos da Guarda, cujo intuito é discutir o tema com as crianças.  “Se não trabalharmos desde cedo sobre o respeito aos gêneros, nossas crianças irão crescer acreditando que a violência doméstica e familiar é uma coisa natural”, afirma Thaís Lopes, Promotora de Justiça e coordenadora do Núcleo Maria da Penha do MPE, em entrevista para o site do MPE.

Entrevista Suzana Orsine, delegada titular da DEAM

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